Em audiência na Comissão de Agricultura da Câmara dos Deputados nesta quarta-feira (28), produtores rurais denunciaram desrespeito à propriedade privada, prejuízos de até R$ 1 bilhão e violentas invasões por “autodeclarados indígenas” no sul da Bahia. Já a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) apontou assassinatos com envolvimento de fazendeiros e policiais, além de demora nos processos de demarcação de terras e de regularização fundiária.
A Força Nacional de Segurança Pública está na região desde o fim de abril. Um dos organizadores do debate, o deputado Evair Vieira de Melo (PP-ES) ainda vê “inércia das autoridades” e disse que vai encaminhar as novas denúncias a vários órgãos dos três Poderes, além de propor uma visita da comissão à região.
“O sul da Bahia é uma joia da coroa. É uma pena que o sistema político e judicial do Brasil tenha permitido que aquele território tivesse a instabilidade que tem. Terras férteis, disponibilidade de água, um solo com capacidade de resposta extraordinária: dê segurança jurídica e o sul da Bahia se tornará um grande celeiro, não só no Brasil, mas do mundo”, afirmou.
O presidente da Associação dos Pequenos Produtores do Entorno do Parque Nacional do Pau Brasil, Vandernilson da Silva, relatou a “expulsão” de agricultores familiares por parte de indígenas. Também reclamou de atraso nos julgamentos de processos de reintegração de posse. “Agora deu uma apaziguada, porque a Força Nacional está lá. Mas ali a gente está dormindo e acorda com tiroteio”, disse.
Denúncia O presidente da Associação do Agronegócio do Extremo Sul do Bahia (Agronex), Mateus Mendes, exibiu vídeo em que suposto carro oficial da Funai era usado para transportar invasores com armas pesadas, inclusive um fuzil 762.
“Eu não sei onde que indígena aprendeu, dentro de aldeia, a fazer fuzil. Percebemos a presença clara do crime organizado se utilizando das pautas indigenistas para roubar propriedades. É porque existe uma coisa agora que é a autodeclaração indígena: bota um cocar na cabeça, pinta o rosto e vai cometer crime porque supostamente o indígena tem a tutela federal”, disse.
A presidente da Funai, Joenia Wapichana, pediu o imediato encaminhamento do vídeo para a procuradoria do órgão e explicou a mediação feita nos conflitos agrários na região.
“Com a Constituição de 88, os povos indígenas deixaram de ser tutelados. O que existe é uma obrigação da Funai para acompanhar os povos indígenas na promoção dos seus direitos. A Funai não coaduna nem faz qualquer passagem de mão na cabeça de nenhum servidor que esteja envolvido com ilegalidades”, explicou.
Investigações A presidente da Funai lembrou que as terras indígenas correspondem a apenas 0,5% de todo o território baiano. No sul do estado, há investigação em curso sobre a atuação de grupos paramilitares e o assassinato de indígenas por fazendeiros e policiais.
Joenia Wapichana atribui a permanência dos conflitos à morosidade dos processos de regularização fundiária, agravada pela Lei 14.701/23, que só admite novas demarcações de terras indígenas ocupadas até a promulgação da Constituição, em outubro de 1988. A constitucionalidade do chamado “marco temporal” segue sendo questionada no Supremo Tribunal Federal (STF).
“A gente quer definir quais são os procedimentos que a Funai deve seguir para que nenhuma parte seja prejudicada. As indenizações são conforme a lei: não podemos indenizar pessoas que não têm direito, mas se tiver o direito, vai ter que ser indenizada”, disse Joenia.
O sul da Bahia tem quatro terras indígenas: Barra Velha e Águas Belas, já regularizadas, além de Barra Velha do Monte Pascoal e Comexatibá, delimitadas, mas pendentes de declaração de posse em análise no Ministério da Justiça.
Após essa declaração, a Funai terá condições de fazer o levantamento de não indígenas nas áreas e das indenizações para quem tiver direito. Joenia reafirmou o compromisso do Estado brasileiro em garantir os direitos constitucionais dos povos indígenas, protegendo vidas, territórios e culturas ameaçadas.